Durante o ano inteiro, viajo bastante a trabalho. O suficiente para entrar em pânico, se eu me deixasse impressionar pelo número expressivo de acidentes aéreos nos últimos anos. De contrapartida, procuro encarar com naturalidade os desígnios do ofício, inclusive, pelo aspecto inevitável de, tão frequentemente, ficar longe da minha amada família, de quem recebo o apoio imprescindível. Faz parte, também, a habitual troca do aconchego do lar pelos impessoais quartos de hotel. Sem falar dos enfadonhos aeroportos, conexões, e o “arrumamalaê” estressante.

São tantos destinos que esqueço onde comprei aquela lembrancinha, ou determinado livro, etc.. Aliás, nunca li tanto, quanto ultimamente. Que seria de mim sem a companhia de uma boa leitura nos “chás de cadeira” das salas de embarque, e durante as horas compridas de voo? É uma profissão desafiadora, bem ao estilo aventureiro de uma sagitariana. E que, por outra perspectiva, a que eu prefiro antepor o meu olhar, me permite o privilégio de conhecer muitas culturas, prazeres da variada gastronomia, e um monte de lugares do País. Também contribui para que eu me relacione com muita, muita gente de todos os sotaques, o que me rende grandes e inestimáveis amizades.

Nas minhas andanças, a reincidência de um fato curioso: as pessoas, quase que por unanimidade, demonstram surpresa quando digo que sou de Fortaleza. Um sorriso seguido de pausa e uma exclamação. Um ritual constante quando soa a palavra Fortaleza. E seguem-se os mais rasgados elogios a essa cidade que todos anseiam voltar ou conhecer.

Fortaleza virou estrela, ao discurso persuasivo de uma bairrista cearense. Um tema “quebra-gelo” que sempre precede minhas reuniões de trabalho. E eu não perco a oportunidade, lógico, de pôr um azeite nessa predileção pela Terra da Luz. Assim, depois de “vender o meu peixe”, o convite para umas férias no Ceará ganha um tom de provocação. Uma "viagem na maionese" pelos próximos 60 segundos, enquanto eu me predisponho a fazer um roteiro de tudo o que Fortaleza tem de bom. Onde comer, o que fazer, e lugarzinhos especiais que só quem conhece, indica.

Já teve gente que veio conferir (e aprovou) o Festival de Jazz e Blues da nossa bela Guaramiranga, e várias outras ameaças que se amontoam a cada viagem, nas prosas pré e pós-reunião. Uma boa e nobre causa para elaborar o prometido roteiro (muita responsa!) que pretendo postar aqui, de bandeja e com tapete vermelho, para os meus amigos publicitários de por aí afora. E, também, para quem mais quiser arriscar os conselhos turísticos dessa nativa que adora sua terra natal.

Sinto-me verdadeiramente privilegiada por morar em Fortaleza. Mais ainda, após percorrer quase todo o País. Para mim, o Ceará é um dos lugares mais bonitos e interessantes para se viver. Tenho me deparado com muita coisa de encher os olhos, é verdade. O Brasil é lindo. Mas, também me vejo, por vezes, decepcionada. Cidades, as quais eu guardava grande expectativa, e que me pareceram mal cuidadas, ou velhas, ou tristes.

Desde criança (e quem me conhece na intimidade, bem sabe), eu tenho a mania de adivinhar como vivem as pessoas, se são felizes, tristes, chatas ou legais, a partir das fachadas de suas casas, dos móveis, trajes e fisionomias. Capto tudo em um segundo. Portão aberto é prato cheio pra mim. Crio as minhas impressões e vou construindo as minhas “verdades imaginárias”. É um hobby esquisito e, talvez, engraçado. Gosto de fazer isso. E faço com discrição pra não levar a fama de “reparadeira”.

Às vezes, vejo a felicidade na singeleza do jardim de uma casa simples, nas janelas escancaradas, no vaso sobre a mesinha ou num pé de jambo frondoso. E posso sentir a melancolia na frieza de uma bela mobília, no interior obscuro, no silêncio ou no vazio de uma dessas “portas abertas”, desses muros baixos, onde o meu olhar esticado consegue entrar.

Quando viajo, então, não resisto à prática desse “sacrifício” de reparar a vida alheia. É fascinante pra mim. Cada cidade é um desafio a desvendar. Sempre que possível, gosto de caminhar a pé pelas ruas, principalmente, se eu estiver num lugar friozinho. Sinto a atmosfera, o sol brando tocar a minha pele e vou pensando sobre o jeito de viver daquele povo. Sinto-me cada um deles e experimento sensações inúmeras. Serei normal?

É um exercício interessante quando se está só, longe de tudo e de todos. Um momento só meu, que também me faz pensar na minha própria vida, nos meus projetos para o futuro que são bem ousados, porém, pacatos (talvez eu os conte aqui). Mas, sobretudo, são vivências que me abrem clareiras no propósito íntimo de me tornar uma pessoa melhor a cada dia, mais atenta às pessoas que eu amo, mais segura dos meus valores. E que, portanto, me instigam a zelar pela qualidade dos momentos que estou entre a minha família. Nada me enche mais de alegria, que o dia do regresso ao lar. Sobrevoar Fortaleza é uma euforia. Felicidade é voltar pra casa, onde não só os meus olhos adentram, mas, o meu coração e a minha alma.
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Foto divulgação.